...A i forca inimiga tinha-se dispersado pelo menos a maior parte d'ella, em seguida ao combate de 21 de julho, e os chefes andavam fugidos. D'estes os principaes eram Maguiguana, Jambui, Guejá, Maxaméne, Picaniço e Chape-Chape irmãos do Gungunhana, Perrane seu tio, e Muzomane, filho d'este, e outros vátuas.

A alma da revolta, a cabeça dirigente, fora o Maguiguana e, apanhado este, estava acabado todo o perigo da recrudescência na revolta.

No dia 7 á tarde apanharam os cipaes um homem que se reconheceu ser espia do Maguiguana.

N'essa noite uma intambuzana que dizia ter fugido ao Jambui, disse que este, Guejá Maxamene, etc., estavam com o Maguiguana em Mathé ou Komathé. Que tinham querido passar a fronteira, mas que o field cornet boer tinha os passes dos Libombos guardados, e que lhes exigia tres quissupos (cestos cafreaes) cheios de libras para os deixar passar. Acrescentou que Jambui e os filhos tinham o Maguiguana guardado á vista, porque não podendo Jambui fugir por não andar a pé, queria ver se salvava a cabeça entregando o Maguiguana aos brancos quando apparecessem.

Era esta mulher que dava notícias mais positivas. Dos outros pretos encontrados, diziam uns que o Maguiguana ainda tinha comsigo muita gente de guerra, outros que andava sempre pelo mato escondido, outros que fugira a caminho da Suazilândia. Emfim, nada se sabia de positivo.

Em vista d'isto, resolvi deixar a columna construindo o posto na povoação do Guejá, local magnífico, dominando uma extensão enorme de terreno e situado na parte mais povoada da região. Eu com o quartel general, 30 praças de cavallaria sob o commando do alferes Reis e 30 cipaes de Gaza sob o commando do governador de Gaza, Gomes da Costa, larguei no dia 8 as sete horas e quinze minutos da manha para Mathé.

A marcha, no dizer dos pretos, era longa (dois dias), e o último ponto em que se encontrava agua para os cavallos era na Xissunguela. Depois era a agua muito rara e so em pequenas poças.

Chegamos a Xissunguela as 10:45 horas da manha, e tendo dado ahi agua aos cavallos, seguimos sem interrupção até as 5:00 horas da tarde. Como estivéssemos proximos á povoação de Cuchahelli, onde diziam estar o Maguiguana, esperei que anoitecesse para ir surprehender a povoação que encontramos abandonada, mas com vestígios evidentes de ter estado lá gente acampada pouco antes, o que concordava com o que dissera um dos nossos pretos que mandara adiante para espionar.

Passámos ahi a noite de 8 para 9, seguindo no dia seguinte de madrugada em direcção a povoação de Mapallene e d'ahi para a do Menza. Pelo caminho, muito trilhado, encontramos grupos de pretos armados, gente que evidentemente vinha desertando das mangas do Maguiguana, mas que, fosse porque fosse, dava a respeito do seu paradeiro as mais contradictórias informaç›es. O que parecia certo era elle ter seguido para S. ou SE., ao passo que o Jambui ficara no territorio do Mathé. Ter-me-hia, portanto, sido muito mais facil e seguro ir prender este régulo; mas considerando que a prisão que tinha deveras importância era a do Maguiguana, não pensei mais sequer em procurar os outros.

Eram tão contradictórias as notícias que davam os pretos, que nada se podia concluir de positivo acerca do destino que levara o Maguiguana, nem pelo que os pretos diziam sobre o caminho que seguira. Havia entretanto indícios que, a quem tenha lidado com pretos, mostravam que lhe seguíamos o resto. Junto á povoação do Menza, havia um grande acampamento de mussassas recentemente abandonadas que o Menza dizia ser de gente do Maguiguana, posto nunca dissesse (por medo de se comprometter evidentemente) que elle em pessoa la houvesse estado. Encontravam-se grupos de gente que voltava para as suas povoaç›es dizendo todos que vinham fugidos ao Maguiguana, embora todos declarando não o haveram visto e nem á chicotada ser possivel arrancar-lhes qualquer esclarecimento.

O caminho estava muito trilhado por gente e por gado, e nenhum havia nos curraes das povoaç›es, dizendo os chefes que tinha morrido, o que era mentira clara porque havia n'elles estrume muito fresco.

De resto era o caminho da Cossine. O Maguiguana era landim cosso, era natural que fosse para a Cossine, cujo regulo Chunguella, influenciado por elle, fizera guerra ao Mafabaze e ao Chibanza, chefes fieis das terras de Lourenço Marques. Calculei, portanto, que elle iria á Cossine ver se ainda ahi nos combatia, e por esse motivo segui aquelle caminho visto que, ou o encontraria em marcha para ali, ou quando por la andasse a reunir gente.

N'este propósito e querendo primeiro que tudo conservar os cavallos em estado de andar, logo da povoação do Menza endireitei para o rio Uanetzi, a fim de dar agua ao gado e passar a noite na margem do rio. Chegamos ao rio as tres horas da tarde. Os cavallos não bebiam desde a Xissunguella, isto é, desde a véspera ás 10:45 da manha, salvo uma agua lodosa e pouquissima n'uns poços próximos á povoação do Mapallene.

Depois de bivacados, deu-se uma circumstância casual que foi o que determinou o surprehender-se o Maguiguana no dia seguinte. Ja não tinha de comer, porque a carne assada que trouxeramos de Nafucue tinha apodrecido, e mandei a uma povoação (Manunga) na margem esquerda do Uanetzi buscar cabritos, carneiros e gallinhas, mas só havia d'estes muito poucos. Ouvindo cabritos na margem direita, disse aos pretos que os fossem buscar, mas elles hesitaram e por fim decidiram a dizer que os cabritos que eu ouvia eram do Maguiguana que estava acampado na margem direita do rio, perto da povoação de Mapulanguene, a pouco mais de uma hora d'ali. Como ja fosse noite mandei recado ao chefe da povoação para que viesse ao nosso encontro na madrugada seguinte para nos indicar o local do acampamento. Este chefe de Maguiguana era matonga e tinha muito gado seu; achava-se, portanto, n'uma situação crítica, porque o Maguiguana de certo lh'o roubaria todo antes de proseguir na marcha, portanto, era interesse seu vel-o preso. Realmente foi elle que nos guiou na madrugada de 10.

N'essa occasião o interprete Joao Massablano, vendo levantar-se de carabina na mão o tal homem de coroa, reconheceu ser elle o Maguiguana, e temendo que elle conseguisse fugir, deu-lhe um tiro que lhe varou as pernas. O Maguiguana caiu então, tendo depois ainda disparado um tiro que não acertou em ninguem e apanhou uma lançada do ferrador da polícia do Maputo, Manuel Joaquim, que se havia apeado e tinha entrado no matto, onde os cipaes o acabaram de matar, trazendo o cadaver que foi por todos reconhecido como sendo effectivamente o Maguiguana. A cavallaria e cipaes que tinham torneado o acampamento trouxeram muitos prisioneiros, entre os quaes Chope-Chope irmão do Gungunhana, Muzamane filho de Perrane, Gorenhane irmão de Zaba, Taretana irmão de Maguiguana, e outros indivíduos, que todos reconheceram o Maguiguana quando viram o cadaver.

Para que em Gaza podesse haver duvida sobre a morte d'este chefe, mandei cortar-lhe a cabeça que levei para o Magudo, onde a metti em alcóol. Hoje mandei reunir em Canja todos os chefes d'aqui para lhes mostrar a cabeça, e dei ordem ao governador do districto para que, para a próxima lua repetisse a mesma exhibição em Canja a todos os chefes do districto reunidos aqui, o que não posso fazer agora por não ter tempo de os reunir todos, pois alguns veem de muito longe.


Source: J. Mousinho de Albuquerque, Campanha contra o Maguiguana nos territórios de Gaza em 1897 (Lisbon: Imprensa Nacional, 1898), 16-20.